domingo, 14 de março de 2010

Em uma Europa em crise, Polônia é vista como uma exceção e exemplo a ser seguido - Le Monde

Florence Beaugé
Enviada especial a Varsóvia (Polônia)


Ela se sente vingada. Ela, que só aderiu à União Europeia (UE) em 2004, discreta como a última da classe, agora é consagrada a “melhor aluna” da Europa! De todos os países da UE, a Polônia é a única a poder se gabar de um crescimento positivo (+1,7%) em 2009.
Todo trimestre o primeiro-ministro liberal Donald Tusk sente um prazer perverso ao realizar uma coletiva de imprensa sobre a economia polonesa na Bolsa de Varsóvia. Sob o olhar das câmeras, ele se posiciona ostensivamente diante do mapa da UE, todo vermelho, com exceção de uma ilhota verde: a Polônia... Mesmo dentro da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômicos (OCDE), nenhum país pode se gabar de ter tido um desempenho melhor.

Sobre as razões dessa boa saúde, tão extraordinária quanto inesperada, os analistas divergem. Para uns, o país se beneficiou de uma conjunção de fatores felizes, quase um “golpe de sorte”. Para outros, o crédito desse desempenho notável é do governo, que desde 2008 soube administrar a crise financeira internacional “com sangue frio”, ao rejeitar o plano de retomada maciça “que todos lhe aconselhavam”, e ao conseguir “dar confiança à população”, como conta o ministro da Economia, Waldemar Pawlak.
Uma coisa é certa: mesmo caindo pela metade em relação ao ano anterior, o consumo continua a estimular o crescimento do país. Com seus 38 milhões de habitantes, a Polônia possui um amplo mercado interno. Menos aberta que seus vizinhos, menos dependente de suas exportações, dona de uma economia diversificada, ela não viu como um drama a desaceleração do comércio mundial.
Em Zlote Tarasy (Terraços Dourados), gigantesco centro comercial aberto em 2007 atrás da estação central de Varsóvia, o movimento é grande a semana inteira nas 250 lojas de estilo ocidental distribuídas em cinco andares. Podendo mudar de comportamento, se as circunstâncias exigirem. “Aqui, uma crise não é vivida como uma fatalidade. As pessoas se lembram do tempo em que não tinham nada e sabem apertar o cinto. Assim que entramos na crise financeira, a questão dos salários, que estava na ordem do dia, foi varrida para debaixo do tapete pelos sindicatos. Uma atitude dificilmente imaginada na França”, acredita François Colombié, presidente da Auchan para a Polônia e a Rússia.
Recuperar o tempo perdido parece ter se tornado a divisa nacional. Trata-se de compensar os anos de escassez da era comunista, mas também de atingir o produto interno bruto (PIB) per capita dos países mais avançados. “A Polônia é um dos países mais pobres da UE, apesar de seu crescimento contínuo há anos. Esse ‘efeito de recuperação’, aliado a seu tamanho, é uma das principais explicações de seu desempenho atual”, analisa Rafal Kierzenkowski, economista da OCDE.

Aqui é considerado como sorte que o país não faça parte da zona do euro. Desde 2000, as autoridades deixam flutuar a moeda nacional, o zloty, tornando as exportações mais competitivas durante a crise, sobretudo a dos carros de pequeno porte da Fiat e da Ford, fabricados aqui. Além disso, a Polônia lucrou muito com os incentivos para compra de automóveis na Alemanha e na França.
O ano 2015 é o novo horizonte fixado pelas autoridades para entrar na zona do euro. “Não estamos com pressa. O exemplo da Grécia nos faz pensar. Nada nos força a isso. Será preciso encontrar o momento certo”, declara Pawlak.
Num futuro próximo, a Polônia deve enfrentar sérios desafios. Seu déficit orçamentário é um deles: em 2009, ele atingia 7,2% do PIB (contra 3% autorizados pelo Pacto de Estabilidade Europeu).
O desemprego voltou a subir desde 2008. Ele chegou a 8,9% da população ativa segundo o Eurostat (mas 12,8% segundo as estatísticas polonesas), e às vezes chega a ultrapassar os 15% em algumas cidades. É o caso, por exemplo, de Lapy, pequena cidade de 20 mil habitantes no nordeste do país. “Todos os habitantes viviam graças a uma única empresa de restauração de vagões de trem. A companhia faliu no ano passado, foi uma calamidade”, conta Konrad Niklewicz, jornalista da “Gazeta Wyborcza”.
O estado desastroso da infraestrutura – estradas velhas, falta de autoestradas e de linhas ferroviárias... – também faz parte das urgências a serem resolvidas. Boa parte dos 67,3 bilhões de euros concedidos por Bruxelas em 2009 para o desenvolvimento do país até 2013 deverá ser destinada a elas.
Apesar dos obstáculos, os poloneses se mostram otimistas. Dois acontecimentos os incentivam a olhar para o futuro com confiança. No segundo trimestre de 2011, o país assumirá a presidência da UE. E em junho de 2012, a Polônia será coorganizadora (junto com a Ucrânia) do Campeonato Europeu de Futebol de 2012. Serão “provas”, como diz Aleksander Smolar, diretor da Fundação Batory, que garante que o país faz ainda mais questão de realizá-las com sucesso, uma vez que hoje seu coração bate firmemente pela Europa.
Todas as pesquisas indicam: de todos os Estados-membros da UE, a Polônia é aquele onde o sentimento europeu é o mais elevado. Para Philippe Rusin, diretor executivo do Centro de Civilização Francesa de Varsóvia, os jovens poloneses realmente se “apropriaram da Europa”. Agora que ela é membro da Otan e da UE, a Polônia se sente em segurança “pela primeira vez em sua história”, observa.
Tradução: Lana Lim

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